Relato de experiência Projeto ROSA DA PALAVRA
Movida pela curiosidade e vontade de experienciar a metodologia da Roda de Leitura fui fisgada para o Projeto Rosa da Palavra, que se propôs a fazer a leitura coletiva dos contos do livro “Primeiras Estórias”, de Guimarães Rosa, em comemoração aos seus 60 anos de edição, de forma remota, sob a curadoria do Prof. Dr. Sandro Soares da UFRN. A princípio fiquei um pouco preocupada, pois não sou estudiosa, nem conhecedora de Guimarães Rosa, mas seguindo as recomendações às pessoas inscritas no projeto vi que esse não era um pré-requisito para participar, pelo contrário, essa seria uma porta de acesso ao universo mágico e mítico de Rosa. Sendo assim, resolvi subir na canoa e fazer a travessia me lançando na descoberta de saborear sua linguagem metafórica, recheada de neologismos e não-ditos, ou melhor, bem-ditos, oportunidade de ter um primeiro contato com a obra desse encantador poeta escritor. A Roda de Leitura formou-se na sua maioria por mulheres maduras e potentes, algumas delas já conhecedoras e estudiosas de Guimarães e sua obra, outras, nem tanto e mais outras, como eu, marinheiras de primeira viagem. O certo é que semanalmente, algumas vezes quinzenalmente, nos reuníamos aos sábados à tarde por cerca de 2 horas e meia para lermos em voz alta coletivamente a delícia dos contos de Primeiras Estórias, a fim de enveredarmos pelo fantástico caminho da palavra poética Roseana, esse autor único que fala, pensa e escreve de um jeito só dele. A leitura em voz alta acordava o texto adormecido no papel e cravava nele a prosódia de cada leitor contador de histórias, nos diferentes contatos com a palavra resultando em variadas sonoridades, ritmos, timbres para esse texto e contribuindo para uma melhor percepção e criação de imagens mentais, formadas por imagens sonoras e verbais. Esse é o grande ganho da palavra proferida coletivamente. A metodologia desta Roda de Leitura era bem parecida com as demais, com algumas particularidades, principalmente, na partilha do sensível, registros de afetos e provocações. A leitura dos contos – no máximo dois por dia – podia ser realizada de duas formas distintas: antes dos encontros ou no momento da leitura coletiva. Iniciávamos sempre com a memória do sábado anterior e terminávamos com a nuvem da palavra, “mosaico das significações pulsantes” em que listávamos num link disponibilizado no chat três palavras que representassem as leituras do dia. Além da Memória de cada encontro e da Nuvem da palavra, cada participante podia registrar suas impressões no Diário chat – durante a leitura –, no grupo do whatsapp e na produção do Mapa da escuta da leitura, “inventário poético dos fluxos”. O mapa da escuta da leitura era feito em casa, após a leitura, embora também pudesse ser iniciado no momento da leitura coletiva. Trata-se de uma produção artística a partir as impressões da leitura dos contos, através de pintura, recorte e colagem e até de obras de arte mais sofisticadas, como as feitas pela Mana, utilizando papel machê para a confecção de bonecos dos personagens. O certo é que nesse deleite nem sentimos o tempo passar, ou melhor, criamos um tempo ficcional, onde só havia espaço para o som das palavras quase em sua função primeira, para sussurros e suspiros, um “não-tempo” quase sempre entrecortado pelo canto de um pássaro, em algum lugar, que soltava seu canto de felicidade e teimava em querer participar dessa maravilha.
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