TRAVESSIA LITERÁRIA DO ATLÂNTICO COM DESTINO A MOÇAMBIQUE: EM BUSCA DE CONHECIMENTOS E PARCERIAS

Há exatamente um mês, depois de quase 10 horas sobrevoando o oceano atlântico, finalmente, pousamos em território africano. Nutria em mim certa satisfação e um sentimento de desejo realizado. Estava acompanhada da escritora e proprietária da Avant Garde editora (PI),  Marleide Lins, de quem recebi o convite para fazer parte da comitiva que realizaria a I Mostra Brasil Moçambique, Conexão Piauí-Maputo, na cidade de Maputo – MZ. A minha participação seria em uma mesa de conversa intitulada “Literatura africana e afro-brasileira”, juntamente com a Profa. Dra. Assunção Sousa (UESPI), Profa. Me. Ruth Gonçalves (UEMA) e os professores moçambicanos Prof. Me. Lucílio Manjate e Prof. Me. Aurélio Cuna, mediada por Elton Pila.

Marleide iria lançar, dentro do evento, a Antologia, de mesmo nome, produzida por sua editora, composta por poemas de autores brasileiros e moçambicanos – consagrados e contemporâneos – organizada por ela e pelo escritor moçambicano Ernestro Moamba, com a curadoria da Profa. Dra. Assunção Sousa e do Prof. Dr. Elio Ferreira. O evento aconteceria no Instituto Guimarães Rosa, com o apoio dessa Instituição, através da Embaixada do Brasil em Maputo e do Nepa – Núcleo de Estudos e Pesquisas Africanas , da UESPI e homenagearia os escritores moçambicanos José Craveirinha e Paulina Chiziane e os escritores brasileiros Maria Firmina dos Reis e Elio Ferreira. Além da relevância do evento por seu valor litero-cultural, entre dois países que se irmanam, soma-se a este o fato deste ano estarmos a celebrar 50 anos da independência de Moçambique e das relações diplomáticas entre Brasil e este país, o que torna o evento ainda mais festivo e significativo, dando a este também um valor histórico.

Na abertura do evento tive o prazer de cantar e contar performando a história O Boi do Piauí (2015; 2021), um reconto da cultura popular piauiense, de minha autoria, que neste ano de 2025 completa 25 de contação na oralidade e 10 anos de livro impresso, pela Editora Nova Aliança (PI), já na sua segunda edição. A narrativa foi iniciada com o poema Né Preto, de Elio Ferreira, por mim musicado. Com suas músicas, cores, melodias e narrativa dançante, a história O Boi do Piauí muito agradou ao público moçambicano, composto por celebridades locais, escritores, professores, estudantes e demais interessados nesse universo.

O Instituto Guimarães Rosa é um pedacinho de Brasil em Maputo e promove constantemente eventos culturais como esse, abrangendo todo tipo de arte como música, dança, teatro, artes plásticas, cinema e literatura pertencentes aos dois países. Também promove intercâmbios para os estudantes e é espaço para trocas culturais e busca de conhecimentos em sua biblioteca bastante farta de literatura e outros escritos do Brasil, de Portugal e de Moçambique. Do hotel em que estávamos hospedados para o IGR era só atravessar a rua, o que nos permitiu estar lá por um tempo maior. Para nossa surpresa o grupo Harém de Teatro, do Piauí, coordenado pelo artista teatrólogo Francisco Pelé também estava em Maputo, em turnê internacional Teatro de Inverno.

Aproveitando esta oportunidade levei a Maputo meus livros literários editados pela Editora Nova Aliança (PI) - a quem agradeço o patrocínio -, para apresentar às escolas e Instituições literárias moçambicanas, com o intuito de divulgá-los e de firmarmos parcerias colaborativas, fortificando laços interculturais.

Estive com crianças moçambicanas para contação de histórias e entrega de meus livros em dois momentos: no IGR, alunos do Colégio Mbilu Ya Yesu e Escola Primária Imaculada e no pátio da Escola Comunitária Rainha da Paz, em festa pelo dia da criança, lá comemorado no mês de junho. Nos dois momentos me deparei com crianças atentas e respeitosas a palavra oral.

O evento também possibilitou-nos conhecer a cidade de Maputo e seus arredores, lugares visitados por nós, literariamente, através da escrita de Paulina Chiziane e José Craveirinha, principalmente. Em nossas andanças pela cidade, ciceroneadas pelo escritor Ernesto Moamba, andamos de txopela; participamos do Programa Moçambique no Coração, da TV M, para divulgarmos o evento; visitamos a Fundação Fernando Couto (poeta moçambicano, pai de Mia Couto) e a Associação de Escritores Moçambicanos, dentre outros.

Em Maputo fala-se a língua oficial portuguesa, mas também as línguas originárias como a língua Changana. Mulheres de capulanas e turbantes coloridos desfilam a nossa frente a cada esquina, mesclando a paisagem urbana feminina com os véus que escondem os rostos de belas mulheres muçulmanas.  A alegria e receptividade está muito presente no povo moçambicano e por um leve descuido temos a impressão de estar mesmo no Brasil. A moeda utilizada é o Metical Moçambicano, mas o dólar também é aceito.

Em um domingo, em visita ao Bairro Polônia Caniço B. na periferia de Maputo, a convite de Ernesto Moamba, assistimos a um culto da Igreja Apostólica Hermonia de Moçambique, regado de música e dança, ao toque dos tambores, um ritual sincrético envolvendo crianças e adultos. E não teve como não ser fisgada e entrar na roda. O culto foi seguido de um almoço oferecido no quintal da casa da família do escritor, em que nos serviram pratos típicos da região como: feijoada, feita com feijão manteiga; macaxeira cozida; batata doce; arroz; matapa (prato a base de coco e amendoim) e a famosa Chiguinha (também a base de coco e amendoim, acrescido da Cacana, uma planta de lá). E ainda houve tempo para aprendermos a colocar faixas e turbantes, ao modo moçambicano. Na volta para o hotel desfrutamos da bela paisagem do mar do oceano Índico que banha a capital e de um pôr do sol espetacular entrecortado por ricos prédios de hotéis, restaurantes, embaixadas e residências que compõem essa parte da cidade.

 Mas como tudo que é bom dura pouco nossa viagem terminou. Voltamos para casa enriquecidas de conhecimentos e aprendizados, com a certeza de que a experiência valeu a pena e que conseguimos atingir nossos objetivos. Na mala, dentre outros objetos, aqueles que foram pontes e que, com certeza, gerarão novos frutos: os livros literários moçambicanos! Afinal, história vai, história vem! Salve, salve!

                                                   

                                                   Profa. Dra. Márcia Evelim de Carvalho

            (Professora, contadora de histórias e escritora de livros literários para a infância)




   Eu com bibliotecária da biblioteca do Instituto Guimarães Rosa



      Em contação de histórias na Escola comunitária Rainha da Paz





No Instituto Guimarães Rosa




 

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

O SEGREDO DA CHITA VOADORA: para povoar imaginários literários

QUEM É MÁRCIA EVELIN - UMA HOMENAGEM DO COLETIVO GELÉIA TOTAL

CAMPANHA LITERÁRIA PARA CONHECIMENTO E VALORIZAÇÃO DA LITERATURA INFANTIL PIAUIENSE