Uma experiência poética para a chegada de " Assim eu conto a história de Anansi"



A vida corre numa velocidade estonteante, imensurável. Acontecimentos vem e vão e nem conseguimos ter tempo para processar tudo com calma, analisando cuidadosamente os detalhes, rememorando, se deliciando no que foi, fazendo ser novamente presente. Ainda quero estar aqui nesse lugar, nesse cenário, nesse acontecimento que foi o lançamento do meu mais novo livro, "Assim eu conto a história de Anansi", no último sábado, 16 de setembro, na Livraria Entrelivros, em Teresina (PI). Imagens voltam a me habitar: 

Um pote de barro cheio de livros, teias de aranha penduradas no teto, um foco de luz verde, um tapete de tecido africano. O batuque do tambor (@tauanaqueiroz) marca a entrada da aranha Anansi (@a.mar.elo), protagonista da história, que carrega consigo sua teia espiralar em performannce.Ela tenta emaranhar a ilustradora (@lineaaaa_) e a escritora (@marciaevelindecarvalho), que se encontram no palco, assim como o público, que se mantem silencioso e atento a seus passos. Num descuido, Anansi rouba o desenho da ilustradora e entrega para a escritora, juntamente com a varinha de Anansi. O desenho se transforma no livro. A história nasce. É hora de contá-la. Aos poucos o tambor vai se calando e a voz da escritora-narradora ecoa e traz a tona a palavra-conto, que oficialmente é lançada aos quatro cantos do mundo! 

Foi assim que as várias linguagens da arte se juntaram para receber "Assim eu conto a história de Anansi", o meu 6º livro pela Editora Nova Aliança (PI), com ilustrações da talentosa artísta plástica piauiense, Aline Guimarães, a mesma ilustradora do meu livro anterior, "Menino do Congo". Eu já conhecia a personagem Anansi há algum tempo, de histórias e mais histórias contadas com Anna Miranda, pelo Grupo Cafundó de Contadores de Histórias. Uma aranha que queria a posse de todas as histórias, guardadas por Nyame, o criador, para contá-las aos povos de todo o mundo e que tinha o poder de se metamorfosear. A partir desse mote, de um conto da tradição oral africana, passei a imaginar como ela conseguiria realizar seu objetivo, criando seu reconto. Em "Assim eu conto a história de Anansi" essa curiosa aranha passa por várias provas que lhe permitem não só adquirir todas as histórias, como também, o dom e a sabedoria para as contar. Nesse percurso Anansi descobre os segredos da essência das histórias, quando se transforma em um velho griô, em uma mulher dançante e em um pajé. 

Originária do povo Ashanti, nativos da República do Gana, a personagem Anansi, Ananse, Anancy, Kwake ou Ananse Ntontan, como também é conhecida na cultura africana é a personagem protagonista do conto que se espalhou por todo o oeste africano (África ocidental e subsaariana). Em meu reconto, Anansi simboliza a criatividade e a sabedoria e tem o poder não só de se metamorfosear, como também de se transmutar para tempos e espaços múltiplos, um tempo-espaço espiralar e ancestral, que também pode representar um não tempo e um não lugar, em que tudo é possível de acontecer. Também pode representar a possibilidade de entrelaçar culturas diferentes, de aproximá-las através das histórias, representadas por um fio que une, o fio de Ananse. Além de Anansi, no reconto aparecem outros personages, todos eles, seres humanos que atuam na dimensão do sagrado, do mítico, do ritualístico, em sociedades da oralidade, que têm a ver com ancestalidade. 

A criança vai se encontrar durante toda a narrativa, seja na figura da aranha Anansi e suas artimanhas para conseguir a posse das histórias, seja nas metamorfoses (isso elas adoram!) e provas vividas por ela, assim como na experiência dos rituais, que inclusive podem ser experienciados durante a leitura. Mas é preciso que seja inteligente para também fazer a leitura das entrelinhas, já que a história esconde muitas sabedorias. Partindo do pressuposto de que a infância habita todo ser humano e que pode ser traduzida na sua capacidade de viver e inventar novos modos de vida, independente de sua idade cronológica, eu diria que a história corrobora com esse propósito do começo ao fim, principalmente no poder de transformação e movimento da personagem Anansi, bem como em sua curiosidade e persistência. 

"Assim eu conto a história de Anansi" é um reconto para a infância de todas as idades, que agrada as várias gerações, já que, quando escrevo uma história, não costumo pensar numa faixa-etária específica, embora o meu público-alvo sejam as crianças. Preso por elementos que considero essenciais para se gostar de uma história, independente da idade, como: o encantamento, a interatividade, a intertextualidade, a inventividade, a musicalidade, além de marcas da oralidade, já que são histórias para serem contadas. São livros que não têm a função didático-pedagógica como principal característica, embora tragam muito conhecimento, mas que possibilitam uma experiência estética e ética (literatura é arte), que concentram várias linguagens. 

Por ser uma história de cunho intercultural, que se preocupa em aproximar culturas e criar pontes entre as diferentes etnias, "Assim eu conto a história de Anansi" traz várias particularidades da cultura do Gana tanto no texto verbal, quanto no imagético, como as referências a gastronomia do país, retratada nos pratos servidos à Anansi; o uso das adinkras, símbolos da cultura local; uso de expressões na língua Akan (uma das línguas faladas em Gana), dentre outros, o que permite a exploração de várias temáticas. O guia para ampliar o conhecimento e despertar a imaginação do leitor, através da mediação dos cuidadores e educadores, que se encontra no final do livro foi pensado para colaborar com esse compromisso. 

Esse reconto é dedicado a Anna Miranda, eterna amiga cafundolesa, que nos deixou a linda canção de Anansi. Uma história que traz muitos simbolismos e metáforas, que reforça a importância de rituais e de conhecimentos outros que precisam ser recuperados nos dias de hoje. Cabe ao leitor(a) descobri-los. 

Dance, dance, dance 
Dance na teia de Anansi 
Teia de histórias 
Teia de histórias 
Antes que a memória dance

 Meus agradecimentos a: Leonardo Dias, Bira, Paula Fabrísia, Tauana Queiroz, Aline Guimarães, Rafaela Gomes, Fernando Cícero, Isabela Alves, Gilmara, Ritinha, Jaqueline, Dilson Lages, Otávio César, Vanusa Coelho, a meus familiares e a todos vocês que lotaram a Livraria Entrelivros para viverem essa experiência poética. 

                                                                                                                         Por Márcia Evelin 

Obs.: Esse texto é parte integrante (modificada) da entrevista concedida por mim à Dilson Lages do @portalentretextos.

VEJALANÇAMENTO DO LIVRO: ASSIM EU CONTO A HISTÓRIA DE ANANSI – 16/SET/2023 no link abaixo:
























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